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ARTIGO - O que (realmente) está por trás da extinção da reserva da Amazônia

publicado: 01/09/2017 10h37, última modificação: 01/09/2017 10h37

Por Daniela Martins Cunha*

Às vezes, ao pararmos para refletir sobre determinados assuntos, somos consumidos pela certeza de que muito pouco ou quase nada sabemos sobre o mesmo. E o pouco que sabemos ainda vem cercado de dúvidas, ainda mais quando há por trás interesses capitalistas governamentais e de grandes multinacionais. Apesar disso, insistimos na reflexão, não apenas para entender um pouco sobre o assunto, mas para assumir um olhar crítico que nos levará a novas perguntas e a novos questionamentos. Quero dizer com isso que opiniões são apenas opiniões, mas podem nos induzir a questionamentos que nos possibilitarão pensar ou repensar determinados assuntos e, talvez seja esse o objetivo desta tentativa de escrita de um texto sobre o que vem ocorrendo na Amazônia e com o meio ambiente no Brasil.

Apesar de estarmos falando de Brasil vou te convidar primeiro a pensar na Europa, principalmente em sua porção ocidental. Desde o século XVIII este continente passa por um intenso processo de industrialização e consequente urbanização. O que a Europa possui de área de preservação florestal? Nada ou quase nada para os parâmetros mundiais, pois a indústria e a urbanização ocorreram à custa da exploração ambiental. E, de repente, fazendo o papel de advogado do diabo, eles nem tenham culpa real disto, pois pensar em meio ambiente e em conservação ambiental é algo recente, nasceu lá mesmo em 1972 com a realização da Conferência de Estocolmo.

Bom, mas por que pensar nisso? Se o crescimento econômico resulta da industrialização e esta da exploração de recursos minerais, logo o Brasil tem mesmo que leiloar a Amazônia. Errado! A Amazônia é a maior reserva florestal do mundo distribuída em oito países da América do Sul, estando sua maior parte no Brasil onde ocupa uma área de 4.196,943 milhões de km2 (IBGE, 2004). Abriga uma biodiversidade de plantas e animais com números monumentais, ainda pouco conhecidos e estudados. Aliás, pesquisadores estrangeiros retiram da Amazônia princípios ativos para a produção de medicamentos e de novos cosméticos patenteados em seus países e vendidos aqui a altos preços.

Lembra-se do caso do cupuaçu, em 2003, quando amazonenses tentaram vender o bombom para a Alemanha e descobriram que não poderiam usar o nome cupuaçu porque os japoneses haviam registrado o nome da fruta como marca e patenteado o processo de produção de chocolates e de cosméticos? Para comercializarem o doce teriam que pagar royalties aos japoneses por uma fruta colhida aqui e tradicionalmente já utilizada na culinária local. Absurdo, não acha? Mas este não é o único caso. Teria muitos outros a serem citados como o óleo extraído da andiroba e patenteado na Europa, EUA e Japão para produção de cosméticos.

E aí você poderia dizer: Já que o Brasil não pesquisa, os estrangeiros devem mesmo fazer este trabalho. Afinal, o mundo carece de pesquisas e de produtos mais eficientes no mercado. Mas por que o Brasil não pesquisa? Porque nunca “sobra” dinheiro suficiente para a educação, ao contrário. Estamos cada vez mais sucateados e, com isso, não podemos produzir crescimento econômico e desenvolvimento com o que nos pertence.

Qual seria então a solução? Com certeza não é leiloar a Amazônia como queriam fazer. A exploração do cobre na Amazônia seria realizada nos mesmos moldes que a exploração de outros minerais no Brasil, como o minério de ferro. Assistimos diariamente centenas e centenas de vagões saindo do país e o que fica aqui? Alguns empregos. A abertura de estradas para a exploração do minério em meio às florestas, o que facilita o acesso e expande a exploração ilegal e o desmatamento. Indústrias que não conseguem competir com o mercado internacional. Veja a Usiminas (instalada aqui, mas de capital estrangeiro, importante pensar, pois gera emprego, mas a maior parte dos lucros vai pra onde?), passou por sérios problemas financeiros, demitindo muitos funcionários porque não estava conseguindo competir com os chineses que, por ironia, compram nosso minério. Ah, e não podemos esquecer a poluição, principalmente de nossos mananciais, dos grandes desastres ecológicos, do rio Doce, um infeliz exemplo. O que volta? Produtos feitos à base de ferro e aço que já não são mais vendidos a R$ 1,99. E pensar que a Vale era uma estatal e foi leiloada pelo governo FHC a preço de banana sendo “entregue” por um valor 28 vezes mais baixo que o estimado para leilão.

Na Amazônia tem ainda a questão das reservas indígenas. E aí penso na Europa novamente. Turistas vão até lá pra visitar monumentos, pra visitar memórias. E o que fazemos com nossas memórias? Com nossos monumentos? Com nossa história? O que temos feito com nossos indígenas, os verdadeiros donos da terra? Voltemos ao início do texto… percebe como tem muita coisa que não chega ao nosso conhecimento? Sabemos muito pouco sobre os bastidores das grandes negociações políticas e econômicas.

Ops! Já estava indo terminar o texto sem pensar em uma solução para preservar a Amazônia. Para mim, só existem duas: a fiscalização, em caráter imediato, e educação, solução de longo prazo. Mas o Brasil não tem dinheiro pra isso! (melhor nem comentar agora para onde tem ido; isso renderia outro texto... risos). Bem, em 2008 foi criado pelo governo brasileiro o Fundo Amazônia cujo objetivo é a captação de recursos para investimento em projetos de desenvolvimento sustentável na Amazônia. Está aí uma boa solução, pois se os países altamente industrializados e urbanizados não possuem mais florestas e sabem da importância de preservar a Amazônia para o mundo, eles devem sim investir nesta preservação não apenas aqui no Brasil, como também nos outros sete países onde a floresta se distribui. Mas sabe o que aconteceu em junho deste ano? A Noruega, um dos países investidor no Fundo Amazônia, cortou investimentos da ordem de R$ 196 milhões neste fundo. Motivo: aumento do desmatamento na Amazônia. Enfim, enquanto a nossa política ambiental não se basear em compromisso e seriedade com fiscalização e educação eficientes, ficará extremamente difícil pensar e efetivar soluções de preservação não apenas da Amazônia, mas do meio ambiente no Brasil.

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* Professora de Climatologia e Poluição Atmosférica do curso Técnico Integrado em Meio Ambiente e de Cartografia e Climatologia do Curso Superior em Tecnologia em Gestão Ambiental do IFMG – Campus Governador Valadares. Atualmente cursa o doutorado em Geografia- Tratamento da Informação Espacial pela PUC Minas.